A reunião nazista que selou os destinos dos judeus da Europa
O genocídio praticado pelos nazistas contra os judeus já havia começado antes de 1942. Entretanto, a chamada Conferência de Wannsee, realizada há mais de 80 anos, entrou para a história como o evento inaugural do assassinato sistemático de judeus. Ao meio-dia de 20 de janeiro de 1942, 15 representantes do Estado nazista, todos com estatura de ministros, se reuniram numa mansão (na foto), às margens do lago Wannsee, em uma localidade recheada de casas luxuosas na periferia de Berlim com a finalidade de organizar e viabilizar economicamente e fisicamente, a matança de mais de dez milhões de seres humanos, fiéis à religião de Moisés.
Os oficiais da SS, secretários de Estado e chefes da administração nazista eram jovens ambiciosos (a metade tinha menos de 40 anos e também a metade havia feito doutorado). O anfitrião do encontro era Reinhard Heydrich, chefe do temido Serviço Central de Segurança Alemão (RSHA).
Na Conferência de Wannsee, nada mais havia a ser “decidido.” Não havia o que deliberar. Havia de se determinar quando como e quanto vai custar?
Reinhard Heydrich deveria coordenar as atividades de todas as autoridades do governo nazista germânico, responsáveis pelo Holocausto. Para Heydrich pessoalmente, a solução para a “questão judaica”, como era chamada na Europa já há mais de 300 anos antes da instalação do Terceiro Reich, significava um ganho de poder dentro da hierarquia nazista. O principal objetivo da Conferência de Wannsee foi, portanto, comunicar oficialmente sua “nomeação como responsável pela preparação da solução final para a questão judaica europeia.”
Na Conferência de Wannsee, de quase duas horas de duração, pouco foi discutido. Na verdade, apenas uma pequena, mas mortal questão para milhões de pessoas causou controvérsia: quem deveria ser considerado judeu? Os participantes da conferência falaram abertamente sobre as várias técnicas de assassinato em massa, numa mostra sobre o modo de pensar de burocratas cínicos. Houve um acordo no número de vítimas potenciais: 11 milhões de judeus deveriam ser levados à “solução final.”
O plano macabro, selado pelos organizadores e gestores da morte com um brinde de conhaque no fim da conferência, foi executado com sucesso. Seis milhões de judeus foram assassinados. Mesmo que a Conferência de Wannsee tenha servido, em primeira instância, à ampliação dos poderes pessoais de Reinhard Heydrich, o título que foi dado ao encontro permanece eternamente ligado ao assassinato sistemático, em que não só as SS estavam envolvidas, mas também setores da polícia, das Forças Armadas, autoridades públicas, sociedade civil e indústria.
Atualmente, a mansão onde ocorreu a reunião abriga um memorial e um centro de formação educacional, onde a discriminação é abominada e os fatos são retratados através de fotos e documentos inquestionáveis.
Reinhard Heydrich foi morto pelos partisans em Praga, capital da Tchecoslováquia em 4 de junho de 1942, mas isso sequer atrasou a matança de judeus. Como vingança, a Gestapo e a SS executraram 340 habitantes de Lídice, uma aldeia perto da capital: 173 homens, 60 mulheres e 88 crianças. Tudo foi derrubado e Lídice foi transformada em um pasto. No Rio de Janeiro, a cidade de Santo Antônio do Capivari, a 40 km de Angra dos Reis foi renomeada Lídice, em 1944, em homenagem às vítimas tchecas.
Estive em Wannsee em 2008, colhendo material sobre a comunidade judaica da Alemanha e a entrevista com o diretor-geral da casa, Dr. Norbert Kampe, que foi publicada na edição da revista Menorah de número 583.Na foto , a fachada do Casa de Wannsee, que fotografei por ocasião da minha visita.
A seguir filme que reconstrói a Conferência de Wannsee em alemão com legendas em inglês:
Abaixo a primeira e a sexta página da minuta da Conferência de Wansee, cópia 16 de 30, datilografada por Ingeburg Werlemann, secretária de Adolf Eichmann. A minuta possui 16 páginas e é o documento oficial utilizado pelo Tribunal de Nuremberg nos processos de crimes de guerra contra a Alemanha Nazista. Abaixo da imagem a tradução da lista de contabilização burocrática de judeus a serem exterminados nos países e regiões que a Alemanha Nazista ocupava em janeiro de 1942, nos países aliados à Alemanha Nazista, nos países neutros, e nos países que a Alemanha Nazista pretendia conquistar. O documento está em domínio público.
Até o final de 1941 os 4.500 judeus que viviam na Estônia já tinham sido executados pelos Einsatzgruppen da SS. Por isso a Estônia aparece na lista como “livre de judeus”. Nos meses que se seguiram, ao longo de 1942, foram estabelecidos campos de trabalho escravo para judeus de várias partes da Europa transportados para Estônia.
A tradução literal do primeiro parágrafo do documento é: “Minutas da discussão – I. As seguintes pessoas tomaram parte na discussão sobre a solução final da questão judaica que aconteceu em Berlim, na Grande Wansee número 56/58 em 20 de janeiro de 1942.”
País Número A. Alemanha 131,800 Áustria 43,700 territórios orientais (oeste da Polônia ocupada) 420,000 General Gouvernement (centro da Polônia ocupada) 2,284,000 Bialistok (nordeste da Polônia ocupada) 400,000 Protetorado Bohemia e Moravia (norte da Tchecoslováquia) 74,200 Estônia - livre de judeus - Latvia 3,500 Lituânia 34,000 Bélgica 43,000 Dinamarca 5,600 França / território ocupado 165,000 território não ocupado 700,000 Grécia 69,600 Holanda 160,800 Noruega 1,300 B. Bulgária 48,000 Inglaterra 330,000 Finlândia 2,300 Irlanda 4,000 Itália incluindo Sardenha 58,000 Albânia 200 Croácia 40,000 Portugal 3,000 Romênia incluindo Bessarábia 342,000 Suécia 8,000 Suíça 18,000 Sérvia 10,000 Eslováquia 88,000 Espanha 6,000 Turquia (parte europeia) 55,500 Hungria 742,800 USSR (União Soviética) 5,000,000 Ucrânia 2,994,684 Rússia Branca excluindo Bialistok 446,484 Total mais de 11,000,000