Situação em Israel dá uma acalmada, mas ainda existem sinais antagônicos
As conversas entre a Coalizão e a oposição estão acontecendo diariamente na residência do presidente de Israel, transformada na arena ideológica desta luta pelo poder político no Estado Judeu. O Knesset está em recesso, do que lá se chama de “recesso de inverno”. São 30 dias de parlamento fechado após o fim do inverno. Ao final do verão existe outro recesso similar.
Isso não impede que parlamentares e ministros apresentem projetos de lei que só começarão a serem apreciados na volta dos trabalhos. E hoje, segunda 3/abr, Avi Maoz, o homofóbico do partido do “eu-sozinho” Noam, deu entrada em novo projeto para remover da Lei do Retorno, o direito de netos de avós judeus, quando os pais não são judeus. O estranho é que isso já tinha sido derrubado pela própria Coalizão e era matéria sepultada.
Os motivos de Maoz ao reapresentar é absolutamente confrontar a todos, inclusive à própria Coalizão de governo a qual pertence. Bibi Netanyahu rapidamente se pronunciou afirmando que qualquer mudança na Lei do Retorno não passará. Esperamos que sim, que não passem. Seria uma legislação que não afeta quem é cidadão de Israel, mas o restante dos judeus do mundo, de forma negativa.
Outro aspecto surpreendente logo antes do início do recesso foi a Coalizão retirar da pauta a lei, já aprovada em primeira leitura, que permitiria políticos receberem “presentes” (segundo uns), “propina” (segundo outros), com a finalidade de cobrirem custas médicas ou legais. Apesar da lei prever que cada doação deveria ser absolutamente declarada e identificada por ambas as partes, ia ser algo muito estranho. Isso foi removido antes de iniciar o diálogo com a oposição.
Gallant ainda não teve seu pedido de demissão aprovado pelo primeiro-ministro, ainda não se desculpou, permanece na função e nesta segunda-feira estava sentado ao lado de Bibi Netanyahu em um evento pré-Pessach numa base de treinamento da força aérea.
Nas ruas temos quatro cenários completamente diferentes. O Ramadã muçulmano tem sido tranquilo. No sábado, dia 1/abr, 100.000 muçulmanos estiveram na Esplanada das Mesquitas para as orações e nenhum incidente foi registrado a não ser uma altercação de um grupo de jovens muçulmanos com policiais de fronteira depois de terminado o evento, do lado de fora do portão de Damasco.
No domingo, a enorme procissão católica do Domingo de Ramos realizou o percurso tradicional dela pelas ruas de Jerusalém antiga, também sem qualquer incidente. A foto deste artigo é da procissão católica. Os dois eventos são uma comprovação absoluta da liberdade religiosa em Israel. Obviamente não vamos fechar os olhos para pessoas e todas as etnias e religiões que são avessas a presença dos outros lá. Mas são pessoas e não governos.
No sábado a noite, 160.000 pessoas voltaram à protestar contra o governo de Israel, nas ruas de Tel Aviv, uma queda drástica no número de manifestantes. Foi a décima-terceira semana. Existia uma esperança geral de que os ânimos arrefecessem com a pausa entre governo e oposição. Não aconteceu. Um dos problemas em Israel é semelhante ao do Brasil, e ao dos EUA, no caso da invasão em Brasília e ao Capitólio.
Apesar das pessoas e da esquerda nos EUA e Brasil quererem criminalizar Trump e Bolsonaro como “responsáveis” pelas ações, sem ele terem estado presentes ou existir nada indicando que as ações foram planejadas por eles, as manifestações nestes três países, se originaram de pessoas comuns. Existem líderes, que lideram apenas os seus e os outros seguem a turba. Não existindo um líder óbvio e conhecido, também não existe uma pessoa que possa mandar parar. Então não pararam em Israel.
E os apoiadores do governo também se viram compelidos a ir para as ruas, e ninguém lá está afirmando que Bibi ou Smotrich ordenaram isso. Simplesmente está acontecendo. Enquanto os manifestantes contra o governo têm seus gritos de ordem contra as novas leis, principalmente, os manifestantes a favor do governo gritam palavras de ordem contra os manifestantes opositores e contra os árabes. É uma situação muito desconfortável.
A cada semana é preciso deixar claro: ainda ninguém morreu nestas manifestações. Isso é ótimo. Muitas pessoas podem imaginar que as manifestações de um lado e do outro são negativas, mas são um exemplo de um país democrático, aonde as pessoas podem ir as ruas com suas opiniões e agendas.
Opinião de José Roitberg – jornalista e pesquisador
Imagem: Procissão de Domingo de Ramos 2023 em Jerusalém, captura de vídeo postado no Twitter.