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11 fatos que todos precisam saber sobre Herzl e o Congresso Sionista

Neste exato momento quando Israel e o mundo judaico, comemoram, na Basileia, os 135 anos do Primeiro Congresso Sionista, de fato a primeira ação política judaica organizada da história, vamos lembrar de onze fatos históricos absolutamente verdadeiros, mas que passam ao largo das narrativas vigentes. E iniciamos com uma pergunta retórica muito incômoda para nós mesmos. Visto que mais da metade dos judeus não se encontram em Israel e não são cidadãos israelenses, o sionismo deu certo por conseguir criar o Estado de Israel, mas não deu tão certo assim em levar os judeus para lá?

(1) Apesar de ter nascido na cidade de Buda, no Império Austro-Hungaro, Theodor Herzl cresceu em Viena e se considerava germânico. O primeiro Congresso Sionista foi marcado para a cidade de Munique, na Alemanha, mas a comunidade judaica alemã que lutava pelo nacionalismo, para serem cidadãos plenos na Alemanha, não permitiu a realização. Por isso, o primeiro Congresso foi realizado na Basileia.

(2) A língua oficial do Congresso Sionista era o alemão. Herzl não sabia russo e desprezava o ídiche, que considerava uma corruptela distorcida do alemão.

(3) Por não saber nem russo nem ídiche, Herzl jamais leu qualquer livro sionista, inclusive os escritos décadas antes dele nascer. Teve a certeza de estar inventando o que judeus russos já praticavam. A primeira aliah, que significa em hebraico SUBIDA e é o termo para designar a imigração de judeus para Israel, começou em 1881, 16 anos antes do Primeiro Congresso Sionista, quando Herzl tinha apenas 21 anos e nem imaginava o que fosse sionismo. Um total de 23.000 judeus, a grande maioria saída do Império Russo, foi para a Síria Otomana até 1903.

(4) O livro que Theodor Herzl escreveu chamava-se Der Judenstaat , “Estado (País) dos Judeus”, e de forma alguma poderia ser traduzido como “Estado Judeu”. Em alemão judeu, no singular é Jude, e judeus no plural é Juden. A primeira publicação do texto na Síria Otomana estava absolutamente correta: “Medinat a Yehudim”, o “País dos Judeus”. Todas as outras estão erradas e o erro foi perpetuado até criar a impressão de que teria sido criada uma teocracia judaica, o “Estado Judeu”. Foi publicado em pequena tiragem em 1896, um ano antes do Primeiro Congresso Sionista.

(5) Em Der Judenstaat , Herzl “imaginou” que o sionismo seria a resposta definitiva ao antissemitismo. Imaginou que os judeus acossados por sociedade antissemitas iriam para o novo país. Imaginou que os governos antissemitas iriam ser colaboradores do sionismo, se desfazendo alegremente de seus judeus, enviando-os para no novo país. Imaginou que no País dos Judeus não haveria antissemitismo. Isto tudo está textualmente colocado no livro sobre o qual muitos falam e quase ninguém leu. De fato, Herzl errou nos seus quatro pilares sobre a necessidade do sionismo.

(6) Herzl nunca parece ter compreendido o nacionalismo judeu nos países da Europa, a luta das comunidades judaicas para obterem cidadania plena. Obviamente se garantir cidadão completo na Alemanha, na Inglaterra, no próprio Império Austro-Húngaro, Romênia no Império Russo e alguns outros estados, era uma agenda absolutamente oposta a deixar seus países construídos, que estavam no “futuro” com as conquistas espetaculares da Revolução Industrial (menos o Império Russo) e irem construir um novo país, a partir do zero. Toda a vertente judaica nacionalista foi opositora de primeira hora das ideias sionistas.

(7) Apesar de ter ido à Constantinopla se encontrar com o sultão em 1896 e não foi recebido. O encontro aconteceu apenas em 1901. Não parece que Herzl tenha compreendido o que eram os judeus “dhimmis”, literalmente pagando um imposto anual de proteção, para terem o direito de permanecerem vivos no mundo muçulmano. Também não compreendeu que turcos não são árabes, nem persas. Provavelmente não sabia das particularidades das comunidades judaicas árabes no Marrocos, Tunísia, Líbia, Egito, Iêmen, Síria e Irã. Não sabia que eram cidadãos sem direitos plenos, mas de forma muito diferente dos europeus.

(8) Em tudo que se escreveu sobre Herzl não consta a posição dele em relação ao judaísmo hassídico iniciado lá nos recônditos do Império Russo no final do século 18 em relação ao sionismo. Para a vertente hassídica, o estabelecimento de um “Israel” precisa ser um acontecimento mágico-divino-automático imediatamente APÓS a chegada do Messias. De fato, no Talmud há uma consideração afirmando que todo aquele que trabalha ativamente pela vinda do Messias, apenas atrasa esta vinda. Sendo assim um Estado de Israel fundado politicamente por homens era inaceitável para todos os hassidim e ainda hoje é inaceitável para três dos inúmeros ramos hassídicos, que pregam abertamente a destruição deste Estado de Israel criado politicamente e que se fique à esperado do Estado de Israel divino com Jerusalém flutuando nos céus. Portanto, a ortodoxia-judaica e a ultra-ortodoxia foram opositoras de primeiras horas ao sionismo. Todavia, os judeus que saíram do Império Russo e foram para o Império Otomano, se estabelecerem onde hoje é Israel, a partir de 1881, eram especificamente religiosos e muitos eram ortodoxos. A grande diferença desta Primeira Aliah para a outras é que nunca pretenderam criar um Estado, mas simplesmente transferir a estrutura do shtetl do Império Russo cristão ortodoxo, para o Império Otomano muçulmano sunita.

(9) O livro Der Judenstaat, de Herzl, é muito maior e mais profundo do que apenas vamos criar um país para os judeus viverem livremente. É uma teoria econômica completa de como criar as relações de trabalho-emprego de um país novo, com a necessidade da industrialização a partir do zero. A bandeira do Primeiro Congresso, desenhada por Herzl, trazia sua teoria econômica em destaque. Além das duas faixas azul em fundo branco, o elemento central em amarelo trazia o Escudo de David com o Leão de Judá inscrito e sete pequenas estrelas, simbolizando os sete dias da semana. Uma estava acima destacada e era o shabat. As outras seis eram os dias de trabalho. Mas esta não é toda a teoria. Herzl propôs que cada posto de trabalho, seja na indústria, na administração e talvez na agricultura, fosse ocupado por dois trabalhadores. O primeiro trabalharia de 8 da manhã ao meio-dia e retornaria ao trabalho às 16 horas, indo até as 20 horas, totalizando 8 horas diárias de trabalho, seis dias por semana. O segundo trabalhador, ocuparia aquela função do meio-dia às 16 horas e depois voltaria às 20 horas, trabalhando até a meia-noite. Com isso, Herzl imaginava não só dobrar a produção e otimizar o uso do maquinário, como também dar, diariamente ao trabalhador, aquele intervalo de quatro horas entre um turno e outro para resolver problemas pessoais, para estudar, para fazer compras etc. Em 1902 Herzl escreveu um livro de ficção científica denominado “Altneuland”, em alemão, literalmente “A Velha Nova Terra”, onde vai ao futuro descrever como tinha se saído o país dos judeus e neste livro, menos lido ainda, se encontra exatamente a visão muito correta e interessante de Herzl para o novo país. Como o antigo futuro já passou, pode-se afirmar que muitas das maravilhas previstas foram superadas pela realidade enquanto outras nunca existiram, até o momento.

(10) Herzl nunca soube ou compreendeu que havia judeus nas Américas e como eles viviam. A mensagem sionista de criar um novo país para um judeu ser um cidadão completo e viver em liberdade jamais atingiu os corações de quem vivia de Buenos Aires até Montreal, pelo simples fato de toda esta massa de judeus vindos da Europa e do Império Russo serem cidadãos livres quer fosse no Rio de Janeiro, ou em Belém, ou em Curaçao, ou na cidade do México, ou em Nova Iorque ou em Montreal. Dizer aos judeus das Américas que eles, que acabaram de chegar, deviam empacotar tudo e ir para outro lugar, foi uma mensagem que caiu praticamente no vazio. Em 1900, mais de um milhão de judeus tinham emigrado apenas do Império Russo para os Estados Unidos, enquanto cerca de 23.000 foram para o que hoje é Israel, e pouco menos de 2.000 estavam no Rio de Janeiro, capital do Brasil. Compreender que não se poderia acenar com liberdade, para quem era livre permite entender por que 26% dos judeus dos Estados Unidos, hoje são ferrenhos antissionistas.

(11) Theodor Herzl faleceu muito precocemente, em 1904. Mesmo que o escritor, Max Nordau, secretário dos seis primeiros congressos e braço direito de Herzl ter tentado manter a liderança, com David Wolffsohn, Chaim Weizmann and Nahum Sokolow. Mas em 1909 Weizman e Sokolow se unem a Menahem Ussishkin, opositor de Herzl e adotam o “sionismo sintético”. Nunca mais deixaram a cadeira da presidência. De fato, Weizmann foi o primeiro presidente de Israel. A oposição então passou a se denominada de Sionistas Revisionistas, que durante algumas décadas foram liderados por Zeev Jabotinsky, considerado fascista, pela esquerda judaica. A pecha de fascista foi lançada sobre Jabotinsky por ele ter liderado grupos que pretendiam a volta do sionismo proposto por Theodor Herzl. Hoje, “revisionismo” é uma palavra que já remete a algo depreciativo. Mas antes, o revisionismo era apenas o retorno aos textos que deram origem ao movimento. Esta é a explicação do motivo para existir zero interesse na leitura do Der Judenstaat: é o livro base do Sionismo Revisionista, e não do sionismo vigente. (obs: se você é do Rio de Janeiro, sabe que existiu um Colégio Hebreu Brasileiro Max Nordau e sim, ele foi fundado pelo ramo Sionista Revisionista da cidade).por José Roitberg – jornalista e pesquisador

José Roitberg

José Roitberg é um jornalista brasileiro e pesquisador em história, formado em Filosofia do Ensino sobre o Holocausto, pelo Yad Vashem de Jerusalém.

2 thoughts on “11 fatos que todos precisam saber sobre Herzl e o Congresso Sionista

  • Yvonne Stern

    O título do documento original de Herzl publicado em 1896 é JUDENSTAAT, com 2 As.
    No artigo acima a palavra STAAT consta com um A, apenas, que não existe no idioma alemão.
    Sugiro corrigir esse erro de atenção.
    Atenciosamente,
    Yvonne Stern

    • José Roitberg

      grato.

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