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Apocalipse pós posse de Bibi não aconteceu

Alguém pode explicar porque as exigências aceitas por escrito e a fanfarronice dos partidos religiosos ortodoxos não foram implementadas? No momento, a questão de qual discurso de Bibi era o mentiroso, se o em inglês ou o em hebraico, está taxativamente respondida: era falso o discurso interno em hebraico, no que parece ter sido um acordo muito bem costurado com os líderes dos partidos religiosos ortodoxos.

A posse do Bibi com um governo que poderia ser a talibanização pretendida por muitos (não por ele) para Israel, está sendo muito tranquila. No dia da posse foi eleito um novo presidente do Knesset, um sujeito a abertamente gay, com voto dos parlamentares ortodoxos abertamente homofóbicos. Ação impossível, exceto por acordos que transcendem os acordos escritos e assinados.

Há um mês afirmamos que o empoderamento em ministérios de religiosos abertamente homofóbicos provavelmente levaria às bases a vontade de agir com a certeza de impunidade. Ainda não aconteceu. Mas a reação do “topo” das bases foi fulminante. Calma! Não contra a população LGBTS+, e sim contra os ortodoxos que votaram em Amir Ohana para presidente do Knesset.

Shlomo Amar, marroquino, 74, ex-rabino-chefe sefaradita, e hoje rabino-chefe sefaradita de Jerusalém, que frequentemente chama as pessoas LGBTS+ de “animais”, publicamente pediu a Deus e tenha piedade daqueles que votaram em Amar para presidente do Knesset. Disse ainda que é “insuportável” ter um homem abertamente gay do presidente do parlamento.

Meir Mazuz, tunisiano, 77, líder espiritual dos judeus da Tunísia e seus descendentes, diretor de uma yeshivá árabe em Bnei Brak, e que tem ligações muito fortes com vários dos religiosos que estão agora no poder político, declarou para os alunos da yeshivá dele que Ohana é uma pessoa “infectada por uma doença” e que era o responsável pelo pisoteamento fatal no Monte Meron em 2021. A lógica alucinada de Mazuz é que Deus puniu os hareidim no Meron porque eles permitiram que Ohana fosse o então ministro da segurança interna.

No auge da pandemia de covid-19 Mazuz era um dos que afirmava que apenas os judeus eram atingidos e que as mortes de hareidim eram uma punição de Deus por eles permitirem as paradas do orgulho gay em Jerusalém.

Fica muito claro, pelo menos para mim, que a visão estreitíssima de mundo e total falta de compreensão da necessidade de sociedades mistas é pregada por rabinos e religiosos do Norte da África, Síria e Iraque, pessoas de famílias que viveram segregadas por mais de mil anos como cidadãos de segunda classe sob o domínio islâmico, e não compreendem o que é a liberdade, pretendendo que serem livres, significa poder agir como o islã agia contra eles, todavia, contra os outros judeus, preferencialmente.

Bibi Netanyahu saiu em defesa de Ohana citando para os dois rabinos uma frase do Pirkei Avot (A Ética dos Nossos Pais) que todo rabino deveria saber de cor e implementar: “’Amado seja o homem por ter sido criado à imagem (de Deus).’ Todas as pessoas são criadas à imagem de Deus. Isso é a crença fundamental que foi dada à humanidade, milhares de anos atrás, por nosso povo, e esta é a crença fundamental que nos guia hoje,” acrescentou o primeiro-ministro.

Arie Dery, líder do Shas e agora Ministro do Interior declarou que foi enganado e não esperava que Ohana fosse o indicado do Likud. Disse ainda que era inaceitável que Ohana tivesse sido cumprimentado e abraçado pelos religiosos que votaram nele. Mas Dery mesmo o abraçou posteriormente.

A passagem do controle total das polícias de fronteira para o piromaníaco da extrema-direita Ortodoxa, Smotrich, foi adiada pelo Bibi por 30 dias.

Itamar ben Gvir, um dos piromaníacos veio a público e declarou que não pretende utilizar, neste momento, todos os poderes que lhe foram dados pela mudança de lei se dias atrás. Mas Gvir pretendia ir à Esplanada das Mesquitas nos próximos dias e já foi dissuadido por Netanyahu. As medidas que Gvir e Maoz falaram durante semanas sobre a exclusão das mulheres nas forças armadas, parecem ter sido colocadas no fundo da última gaveta.

O presidente Herzog, em público, pediu para os cidadãos e os judeus do resto do mundo pararem de imaginar que o Estado de Israel e a democracia estão condenados. O rabino chefe do Shas declarou que não vai apoiar nenhuma lei ou medida que prejudique a sociedade secular israelense.

O novo Ministro das Comunicações aceitou a demanda hareidi sobre cancelamento do fim dos serviços de telefonia 2G e 3G utilizadas pelos telefones kosher (apenas fazem ligações telefônicas). Adiou o fim dos serviços para 2025 e determinou a implementação de uma capacitação técnica para a criação de telefones kosher 4G, que não existem no momento. Os números dos telefones kosher se inicia com um prefixo diferenciado. O novo ministro também cancelou a portabilidade destes números, impedindo que um usuário de telefone kosher compre um smartfone e mantenha seu número. Esta foi uma exigência de patrulhamento hareidi, que não tem repercussão nenhuma para o restante da população.

Imagem: primeira reunião do novo mandato de Bibi Netanyahu no dia 29/dez/2022. A direita dele, falando, o Ministro do Interior, Arie Dery. Foto de Amos Gershom, divulgação PMO.

José Roitberg

José Roitberg é um jornalista brasileiro e pesquisador em história, formado em Filosofia do Ensino sobre o Holocausto, pelo Yad Vashem de Jerusalém.