O único lugar em que os judeus foram atacados em Yom Kipur, foi em Tel Aviv
Um grupo judaico, o Rosh Yehudi, que é de Tel Aviv mesmo tem sinagoga lá, e parece ser composto por muitos jovens hareidim que não se vestem com ternos pretos decidiu fazer um Yom Kipur na rua com segregação entre homens e mulheres, como acontece na sinagoga deles e como aconteceu nas ruas da cidade em 2020, 2021 e 2022 (durante a pandemia com medidas de distanciamento e limitação de púbico).
Alguns meses atrás o ramo ortodoxo ultranacionalista da Coalizão de governo apresentou uma proposta de lei para obrigar a segregação de gênero em eventos públicos, todos os eventos, e não apenas os deles. Depois de dois dias de muita discussão e reprovação, o primeiro-ministro retirou o projeto de lei.
O prefeito de Tel Aviv, Ron Huldai proibiu a segregação de gênero em via pública e a coisa foi para justiça. A Suprema Corte manteve o lado da prefeitura e proibiu a segregação de mulheres nos espaços públicos da cidade. Os mesmos juízes que permitiram em 2020, sob o governo do mesmo primeiro-ministro, mas sem os kahanistas na Coalizão.
Como o momento atual é de confronto aberto os caras chegaram cedo e dividiram a praça com estruturas simples de bambu e bandeiras de Israel. Agora vou defender o lado deles. E qual é o problema disso? O evento é deles !!! É para eles e para quem quiser participar NA FORMA DELES !!! Não é um evento da prefeitura nem um evento oficial da cidade.
Mas, como eu disse, o momento é de confronto. E abertamente os grupos hareidim e kahanistas defendem não obedecer a leis que não sejam da Torá, não obedecer decisões judiciais (quando são contra eles) e exigir o cumprimento de decisões judicias (quando são a favor deles), e não obedecer a polícia, não prestar queixas a polícia. Então ao segregar uma via pública, neste momento, é desobedecer a decisão judicial.
Mas, como eu disse, o momento é de confronto. E uma penca de manifestantes antigoverno foram para cima de arrancaram as divisões feitas bambu com bandeiras de Israel. E aqui vou me posicionar contra eles. Estes manifestantes não possuem mandato legal para agir contra quem está desrespeitando uma decisão judicial. A polícia tem, os civis não têm e não podiam ter feito isso. Pelo que entendi, os policiais no local disseram não ter recebido ordens para a remoção e aí os manifestantes resolveram passar a ser justiceiros.
O ramo extremista-ortodoxo e até o Bibi estão capitalizando o incidente. O primeiro-ministro declarou que “para nossa surpresa, especificamente no Estado Judeu, no dia mais sagrado do ano, manifestantes de esquerda atacaram judeus durante as orações deles.” Não há qualquer evidência de que tenha sido um ataque convocado pela esquerda judaica ou sequer planejado. É possível que alguns que atacaram fossem membros? Sim, só a polícia de Israel e os amigos sabem. Mas já há mais de seis meses o Bibi vem definindo que tudo que é contra o governo atual é de esquerda, apesar da imensa maioria dos partidos de oposição serem igualmente de direita política. E de vários nomes destes partidos serem muito mais a direita que ele próprio.
“Parece que não existem limites, regras ou fronteiras no ódio nutrido pelos extremistas de esquerda. Como cidadão israelense eu rejeito isso. Este comportamento violento não tem lugar entre nós.” Acrescentou Bibi.
Ben Gvir, do partido Poder Judeu, o ministro da segurança nacional disse que vai fazer um evento segregado na quinta-feira, antes de Sucot na praça Diezengoff e o prefeito Ron Huldai disse que não vai fazer não.
Já o líder da oposição o Yar Lapid também aproveitou para jogar querosene no fogo, decidindo migrara para a categoria de político piromaníaco. “O núcleo ortodoxo ultranacionalista que veio ao bairro decidiu trazer a guerra sobre nós também (se referindo aos ataques dos ultranacionalistas ortodoxos aos palestinos). Eles deixaram claro e explicaram para nós que existe apenas uma versão do judaísmo – a versão deles. A demanda deles em nome da tolerância é que até mesmo em nosso bairro, eles são quem decidem o que é permitido e o que não é permitido.”
“Por 75 anos, a imensa maioria dos israelenses conseguiram chegar a acordos sobre o uso do espaço público no Yom Kipur, de acordo com cada comunidade. Por 75 anos, as comunidades se respeitaram a despeito de suas diferenças, e não levaram a política para o Yom Kipur”, declarou Beny Gantz.
O prefeito de Tel Aviv, Ron Huldai disse que o telefone dele só tocou duas vezes em Yom Kippur “hoje e em 1973. A área de Tel Aviv-Jaffa vai permanecer livre e nós não vamos permitir que extremistas ditem o que vai acontecer em espaços públicos nunca mais. Eu venho dizendo há anos que existem forças trabalhando para transformar o país num estado haláchico, e se nós não acordarmos, vai ser tarde demais.” (estado regido apenas pelas leis da Torá)
Gideon Saar pegou pesado: “Aqueles que estão atacando e humilhando religiosos judeus não estão defendendo a identidade liberal de Tel Aviv. Ao contrário, estão aumentando as divisões entre as partes da nação.” Declaração perfeita, não fosse o fato dela jamais ter sido emitida com ultra-ortodoxos atacam mulheres que estão conduzindo serviços religiosos na área igualitária do Kotel, inclusive rasgando livros de oração, jogando rolos de Torá no chão e cuspindo nas mulheres.
A única conclusão é que em nome da tolerância nós devemos aceitar o mando deles sobre nós. Será que 5784 vai ser o que promete? Este incidente de liberais e seculares atacando ortodoxos é o primeiro, pois o normal até ondem foram os ataques deles contra liberais, reformistas e seculares. Foi o último do ano ou o primeiro do ano? Faça sua aposta.
O rabino Israel Zeira, líder do Rosh Yehudi, que publicamente se dissociou de Ben Gvir encerrou a questão pelo lado dele de uma forma bem padrão: “Eu perdoo aqueles que destruíram as orações.” Provavelmente nenhum envolvido está nem aí para o perdão de Zeira.
O mesmo desafio à justiça aconteceu em outros pontos de Tel Aviv e em outras cidades de Israel sem terem sido relatados incidentes.
Encerro deixando claro que impedir os religiosos judeus de segregarem os eventos deles, em minha opinião é uma decisão que seria considerada um ataque antissemita, se acontecesse em qualquer país fora de Israel. A Suprema Corte, que tomou a decisão de proibir, os mesmo juízes que em 2020 tomaram a decisão de permitir, seria acusada de ser antissemita, não fossem judeus. Já lutar contra as imposições da ultra-ortodoxia em eventos que não são dela, aí é um dever de semitismo mesmo!
Se você vai a um evento ou ambiente ortodoxo TEM QUE RESPEITAR AS NORMAS DELES. Não se preocupe com uma ação ao contrário pois eles nunca irão a eventos religiosos que não são deles.
Cada qual com seu cada qual. Apesar de Roma ser algo problemático para nós, o ditado é em Roma faça como os romanos e não como os romenos.
Opinião de José Roitberg – jornalista e pesquisador