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Porque a estrela amarela imposta aos judeus era amarela

De fato, nós, judeus nunca nos preocupamos com a cor e nunca procuramos explicação para o amarelo. Parece que ninguém se preocupou em documentar esta questão. O que sabemos é o seguinte.

1) A primeira exigência legal para judeus usarem identificações que os distinguissem do restante da população ocorreu no século 8 EC, num decreto do Califa Omar II (muçulmano). Os judeus precisavam usar dois emblemas amarelos, um no chapéu e outro num colar no pescoço. Os judeus eram obrigados a usar cintos. As mulheres judias eram obrigadas a usar um sapato preto e um sapato vermelho. Todos os “dhimmis”, cidadãos “protegidos” pelo islã, ou seja, judeus e cristãos tinham que usar no colar uma plaquinha escrita “dhimmi” em árabe.

Foto: Valdemar Atterdag segurando Visby como resgate, 1361, por Carl Gustaf Hellqvist (1851–1890) mostra um comerciante judeu vestindo um Judenhut, chapéu de judeu (à direita).Carl Gustaf Hellqvist, domínio público, via Wikimedia Commons

2) Os diversos decretos da Igreja, até o ano de 1274 (século 13), obrigaram judeus e muçulmanos a usar roupas diferenciadas e emblemas, mas não há registro das cores dos emblemas. O dos judeus era um oval de “um dedo de largura e um palmo de comprimento”, sobre a roupa na altura do peito. Bem grande.

3) Em 1274 o Rei Eduardo I da Inglaterra, decreta o Estatuto dos Judeus e obriga a usarem um emblema com as tábuas da lei em amarelo, do lado esquerdo do peito sobre a roupa com 15 cm de altura e 7,5 cm de largura. Deste, existem gravuras da própria Igreja mostrando.

4) Desde antes disto, mas sem definição histórica correta ou modelo conhecido, os judeus dos Estados Germânicos precisavam usar um emblema na roupa e as mulheres o chapéu de ponta (chapéu de bruxa). Existe uma publicação oficial do dia 16/out/1254 dispensando os judeus de Erfurt (na Alemanha, de usar o emblema). Então se sabe que usavam antes, mas não se sabe qual.

5) No século 14 os judeus da cidade de Roma e os judeus de Portugal foram obrigados a usar a estrela de 6 pontas vermelha. É a primeira referência a judeus e emblemas com a estrela de “David”. Não há gravuras.

6) No século 16 os judeus dos Estados Germânicos passaram a ser obrigados a usar a “rota”, ou “anel judaico”, que era um anel de tecido com cerca de um palmo de diâmetro na cor amarela (existe até o decreto com o desenho do anel no museu da cidade de Worms), com o traço de uns 2 cm de largura sempre visível sobre o lado esquerdo do peito. Há muitas gravuras mostrando isto.

7) 1933 – Pela Lei da Pureza da Raça do governo da Alemanha Nazista, que determinou que os judeus não eram cidadãos, lhes foi proibido utilizar as cores nacionais da Alemanha e as cores nazistas, mas o decreto tinha um parágrafo liberando os judeus para utilizarem as suas próprias cores. Existiu até mesmo o movimento das instituições judaicas dirigentes chamado “Use Com Orgulho”, estimulando os judeus a usaram braçadeiras brancas com estrelas azuis ou azuis com estrelas brancas. O documento existe, bem como muitas braçadeiras em museus do Holocausto.

8) 1939 – Quando a Alemanha Nazista ocupa a metade oeste da Polônia e a União Soviética, sua então aliada, ocupa a metade leste da Polônia, o governo nazista obriga os judeus poloneses sob seu governo a usar uma braçadeira branca com estrela azul. Existem os documentos e muitas braçadeiras, que inclusive traziam escritas funções como: dirigente, policial judeu, médico, enfermeiro, corpo de bombeiros e outras.

9) Em primeiro de setembro de 1941, o governo da Alemanha Nazista decreta a obrigatoriedade do uso de uma estrela de David amarela, com traçado preto e a palavra “jude” (judeu em alemão), escrita lembrando letras em hebraico. Gradualmente isso foi sendo adotado em todos os países ocupados pela Alemanha Nazista, com a palavra judeus nas línguas locais. Havia cartazes para a população não judaica onde o símbolo era mostrado ao lado de um texto em destaque: “Quem estiver usando este emblema é um inimigo de nosso povo.”

10) 1979 – Poucos meses após a Revolução Xiita Iraniana (grupo que está no poder até os dias de hoje), DIZ-SE, que foi passado um decreto, obrigando os judeus a utilizarem um emblema constando de dois traços finos amarelos do lado esquerdo da gola de suas roupas e que todos os comerciantes judeus precisavam avisar ao freguês que estariam comprando de um judeu. Não temos nenhuma confirmação documental ou fotográfica disto.

Não sabemos se de fato existiu ou se ainda existe, mas não há problemas para os 25.000 judeus do Irã. Só existem um punhado de fotos de judeus no Irã, todas eles tiradas em cerimônias religiosas dentro de sinagogas onde os homens estão cobertos por xales de oração ou jovens estão usando camisetas de malha. Nestas fotos não se percebe qualquer símbolo obrigatório. Mas se sabe, e isso é muito bem documentado, que o Irã possui leis sobre cortes de cabelo autorizados (com poster nas barbearias), proibiu roupas de qualquer tom claro ou vivo, e também baniu as gravatas com a declaração de que elas eram cruzes penduradas em volta do pescoço.

Podemos então apenas IMAGINAR que ao longo de quase 1.200 anos, a decisão do Califa Omar II pelo amarelo, foi copiada por decretos posteriores e encarada como “a cor normal para o símbolo obrigatório para os judeus.”

Mas também podemos IMAGINAR que uma estrela amarela sobre roupas escuras fornecia um emblema muito visível, mesmo à distância. Nos campos de concentração (não nos de extermínio), eram utilizadas diversas outras cores em triângulos, como por exemplo: rosa para homossexuais, vermelho para comunistas, preto para criminosos comuns, roxo para Testemunhas de Jeová, além de outros. Há muita documentação sobre isso.

Outro exemplo: num campo de concentração um judeu comunista teria como emblema um triângulo amarelo sobre um triângulo vermelho, formando a estrela de seis pontas. Um criminoso homossexual teria um triângulo rosa sobre um triângulo preto, e assim por diante realizando as combinações necessárias. As poucas fotos oficiais do membro judeu do parlamento iraniano (há uma vaga por lei para cada minoria religiosa), sempre são tiradas pelo lado direito. A única foto tirada pelo lado esquerdo, teve a gola do paletó levantada para ocultar a gola da camisa social. Portanto, de fato, não se sabe.

José Roitberg

José Roitberg é um jornalista brasileiro e pesquisador em história, formado em Filosofia do Ensino sobre o Holocausto, pelo Yad Vashem de Jerusalém.